domingo, 20 de fevereiro de 2011

Pais

"No início, os filhos amam os pais. Depois de um certo tempo, passam a julgá-los. Raramente, ou quase nunca os perdoam." - Oscar Wilde

Amar a mãe e o pai sempre foi uma lei incontestável. Repudiado sejam aqueles que ousaram questionar o amor que, obrigatoriamente, devem sentir pelos próprios pais. Chega a ser um pecado este questionamento, afinal, são meus pais. Foram eles que me criaram e que não me abandonaram. Que inseriram em mim todo o amor que possuíam, a preocupação que detinham e o dinheiro que ganhavam. Também, amigos, nunca se ouviu dizer que um filho corajoso nasceu de um pai temeroso. Também, inconscientemente, podem transferir suas inseguranças, seus medos e, principalmente, suas fraquezas. E, muitas vezes, nós absorvemos.

Muitas coisas, queria eu, externalizar sobre minha mãe. Sobre minha absorção de seu negativismo extremo, seu pessimismo constante e desequilíbrio pueril. Ao entrar na porta de casa, coloco-me em estado defensivo, um Stand-By corporal onde meus olhos vagueiam junto com minha atenção pelos detalhes da casa enquanto ela remoe, repetidamente e sem novidades, suas lamúrias. Ela culpa os filhos, sutilmente - e talvez sem perceber - pelos problemas que passa atualmente. Ela, também sem saber - ou sabendo, inconscientemente - é responsabilizada pelos filhos por desequilíbrios herdados..

Todas as características que herdei dela, são as que mais odeio em mim. Que mostram-me mais fraco, inseguro e zerado em minha auto-confiança. Todos nós passamos ou passaremos por períodos assim. Sinto-me apertado por tais confissões e, ao mesmo tempo, seguro. Seguro, pois sei que os filhos que mais dão certo, são aqueles que vêem os pais como verdadeiramente são. Não há nada pior em uma educação do que a hipocrisia.

Meus pais não são pais. São, antes de tudo, pessoas. Com suas fraquezas e decepções. Onde podem tanto ser um exemplo de como devo ser como pessoa, como também de como Não Ser.

"Às vezes o pai castiga o filho porque este fez o que o pai, quando filho, não conseguiu fazer." - Juvenal

6 comentários:

Unknown disse...

Parte da nossa maturidade é justamente conquistada quando conseguimos enxergar os defeitos e fraquezas dos nossos pais, que até outrora eram heróis incontestáveis.
Eu sei que herdei muito da minha mãe e talvez por isso tenhamos uma relação um tanto conflituosa. E sei também que as minhas inseguranças, meu pessimismo e meus complexos tenham talvez nascido de frases soltas que ela disse sobre mim, para mim.
Mas sabe... Dias depois que meu pai morreu, ela me disse uma coisa que sanou muitas das nossas diferenças (ou igualdades): "O melhor presente que seu pai me deixou foi vc, filha"
E assim a gente vive. Uns dos meus maiores desafios são aceitá-la e conseguir respeitar os seus defeitos, assim como o fato de que pais não são heróis incontestáveis como eu pensava aos 7 anos.

Anônimo disse...

Eu sou fraco, não consigo terminar muita coisa e raramente mantenho-me firme em uma opinião ou propósito... o erro de minha mãe, sua fraqueza, seu pior defeito? Achar que sempre vou dar certo, e me dar forças para "recomeçar" após um fracasso. Bondade demais também é defeito; mas desse mal eu não sofro, porque lutei e consegui suprimi-lo. Ótimo texto.

Xxx disse...

Olá, Cláudio,

Lindo post... e para vc que gosta de ler e ter conhecimento, deixo como dica ler o psicólogo infantil Donald Winnicott. Ele fala bem sobre esta questão de o que é ser uma mãe, ser um filho e desse interim que une um ao outro... e diz que é tão próxima esta relação que um não existe sem o outro, chegando a se confundirem corporalmente...

Abraços... e até breve.

Natália disse...

Até os 14/15 anos meus pais eram sinônimos de proteção. E de fato, foram. A gente confunde essa proteção com heroísmo, simplesmente por serem o exemplo mais próximo que nós temos do que é ser um ser humano. Eles são uma espécie de receita. E quando a gente cresce percebe que nessa receita falta ingrediente, que o fermento tá vencido. Aíh eles se tornam antihérois, e nos vemos independente deles. E nessa nos revoltamos por herdar traumas que não são nossos, medos que não são nossos. Esquecemos que isso é cíclico, que eles também herdaram de alguém. De um certo tempo pra cá não me angustia mais perceber que meus pais são pessoas, que adotam posturas que eu não aprovo. Hoje eu não os vejo mais como heróis e nem como antiheróis, os vejo como pessoas que são. Cheios de falhas... exatamente como eu.

Renato Oliveira disse...

Oi Cláudio, boa tarde :)

Vou comentar primeiro sobre o post do filme "Tudo sobre minha mãe".
Fabulosa a tua colocação! me fez lembrar um pouco de Jung, pois ele faz todo um estudo sobre personas, e apesar de conhecer pouco a respeito, há explicações muito interessantes. Sobre as diferentes personas de Manuella, realmente, elas não eram perdidas ou deixadas ao caso, mas trocadas como você colocou. Nesta condição, eu também acredito que o todo exista sim, pois cada persona é do próprio indivíduo, como um ser integral.

Por outro lado, a falta e incompletude que geralmente me refiro é sempre em referência as concepções do Lacan que relaciona a construção do sujeito com a Estrutura da linguagem. Em linhas gerais, o desejo é sempre uma falta e conforme a criança descobre que o seu objeto de desejo primário (a mãe) possui um objeto externo e que ela terá que renunciar a mãe para elaborar a existência de uma Lei, ela passa a conceber que a mãe é faltante, pois mostra falta ao desejar algo externo, e que ela - a criança - também precisa elaborar este vazio por meio de objetos que não seus próprios pais, caso o recalque tenha sido satisfatório. Dando assim, início a um processo metonímico, de um objeto a outro, mas que nunca haverá completude, por ser pulsional, e a satisfação completa das pulsões só se dá com a morte mesmo. Se o sujeito não tiver falta, ele não deseja e não está submetido a rede simbólica (lei- recalque).E na linguagem também há falta porque nunca conseguimos exprimir, com palavras, a totalidade do que queremos expressar. E sempre supomos um entendimento no outro. ;)

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Intrigante o assunto do teu post.
A meu ponto de vista, trata-se de um pensamento autônomo. Antes de pais, são pessoas - muitos não conseguem elaborar isto e passam anos de suas vidas na tentativa em ser uma extensão do desejo dos pais, cativos a este. Teu texto me fez lembrar uma citação que li no começo do ano:

"para existirmos psiquicamente, temos que matar a representação narcísica que ocupamos no desejo daqueles que nos deram vida". (Leclaire, 1975).

Enfim, até breve! um abraço.

Anônimo disse...

Texto forte.